Apesar de que em Mianmar haja oficialmente uma liberdade de culto, a evangelização neste país, maiormente budista, passa por uma série de dificuldades, tal como contou um missionário espanhol que pôde entrar no país graças a um visto de negócios, pois o visto para religiosos só é dado aos que desejam “uma experiência em um templo budista".

Em uma entrevista publicada pelas Pontifícias Obras Missionárias, o anônimo missionário espanhol explicou que espera-se cerca de 300 mil pessoas nos encontros com o Papa, dos 700 mil católicos do país.

"Como as pessoas são pobres, e é muito caro viajar à capital, a Igreja está fazendo muito esforço a fim de que os fiéis possam participar dos eventos", explica o missionário e afirma que o Cardeal Charles Bo escreveu a todas as paróquias, dioceses, congregações e bispos, pedindo-lhes que ajudem os fiéis a participarem das atividades.

"Todos nós colaboramos economicamente para apoiar os traslados" e inclusive "monges budistas ofereceram suas instalações para acolher os peregrinos", informou.

A fé católica em Mianmar

O missionário, que prefere permanecer anônimo para não colocar em perigo a sua missão no país, recordou que Mianmar é maiormente budista, 87,9% da população; e que "oficialmente" existem outras religiões minoritárias, entre elas, cristãos e católicos, que são cerca de 700 mil.

Entretanto, afirma que apesar de que haja celebrações de culto nas ruas, na verdade, as oportunidades que existem na sociedade para os que não são budistas são muito diferentes. "Se você é budista, tem mais oportunidades para chegar a um cargo público, ou pode conseguir um cargo melhor".

O missionário, que está no país há sete anos, explica que "não permitem a presença de missionários estrangeiros. Eles têm medo que façam proselitismo. Na verdade, os irmãos (de comunidade) nativos, embora sejam reconhecidos como tal, oficialmente não podem evangelizar. Aqui quase não há conversões, o crescimento do cristianismo ocorre principalmente segundo a natalidade".

Por isso, explica que ele não está registrado como religioso, mas tem um visto de negócios. "Existe um visto religioso, mas só para aquelas pessoas que querem uma experiência em um templo budista", indicou.

Entretanto, assegurou que esta situação melhorou. “Antes de dezembro de 2016, tínhamos que sair do país a cada 70 dias. Atualmente dão permissões para estadias mais longas. Nós não contamos para ninguém que somos missionários. Quando as pessoas nos cumprimentam e nos perguntam, dizemos que somos professores, tradutores. Por esta razão, eu não posso dizer o meu nome nesta entrevista".

Ele não especificou o número exato de missionários no país, mas assegurou que são cinco espanhóis. "Desde 2010, nos reunimos no grupo missionário ORLA (Overseas Religious and Lay Associates). Desde então, nos encontramos para compartilhar dificuldades, experiências e incentivar-nos mutuamente através da reflexão e formação especialmente na enculturação.

“Costumam ser cerca de nove congregações diferentes, mas há mais", precisa.

O missionário recorda que, em 2011, houve uma reunião sobre a Nova Evangelização, na qual estiveram presentes religiosos e sacerdotes.

"Disseram e apontaram que a Igreja em Mianmar foi passiva na evangelização, porque oficialmente foi impossível. Isso impediu a criatividade. É necessário sair mais, ir às zonas rurais, onde talvez seja um pouco mais fácil de entrar", assegura.

Trabalho com os mais necessitados

Segundo explicou, alguns dias depois de sua chegada, o Bispo de Yangun, Dom Charles Bo, pediu para ele morar em um bairro pobre com uma maioria de muçulmanos e hindus da raça indiana. "Começamos a visitar famílias pobres, pessoas idosas que viviam sozinhas. Rezávamos com e levávamos a comunhão para eles. Além disso, tivemos durante um ano uma casa para acolher os jovens que vinham estudar na capital, graças às bolsas de estudo dos jesuítas", recorda.

Além disso, explicou que alguns jovens queriam seguir o seu carisma, então tiveram que começar a sua formação de maneira intensiva.

"É muito importante que, quando se abre uma nova casa, e surgem vocações nativas, se formem bem, para que eles possam trabalhar com mais liberdade de movimento e conhecimento da sua própria sociedade", insiste.

Atualmente, se dedicam a dar aulas de inglês às crianças do bairro, que são todas budistas. "São famílias normais, com poucos recursos. Queremos oferecer-lhes a possibilidade de que os seus filhos aprendam inglês e coreano, porque todos sonham ir para a Coréia do Sul".

O missionário assegura que a Igreja Católica é um "testemunho de paz, união e encontro" dentro da sociedade de Mianmar e sublinha a iniciativa que eles têm na cidade de Mandalay, berço do budismo, onde há um grupo de ecumenismo que une muçulmanos, budistas, protestantes e católicos.

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Além disso, realizam muito trabalho social, quase todas as comunidades religiosas católicas e também budistas têm casas que acolhem as crianças, para que possam estudar e elas visitam os seus pais uma vez por ano.

"Em 1962, o governo expropriou a Igreja de todas as suas escolas e centros, e deixou de existir uma educação que não era a estadual. Mas agora, parece que acaba de dar-se a possibilidade de fundar jardins de infância. Eu sei que algumas congregações estão se preparando para abrir creches oficiais em diferentes regiões do país", assegura.

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