O Papa Francisco confessou em uma recente entrevista que se sentiu por pessoas que se apresentaram como amigos seus mas, possivelmente, ele não tenha visto mais que uma ou duas vezes na vida.

Assim o afirmou o Santo Padre em uma entrevista com o jornalista evangélico Marcelo Figueroa de Rádio Milenium de Buenos Aires (Argentina) que foi difundida no domingo, 13 de setembro, e que fora realizada na Casa Santa Marta onde reside o Pontífice.

Ao ser perguntado sobre a amizade por Figueroa, o Pontífice disse que existe no mundo uma tendência a ter amigos por interesse “vejamos que proveito posso tirar de me aproximar dessa pessoa e fazer-me amigo dela”.

“Isso me dói. E eu me senti usado por pessoas que se apresentaram como amigos e que eu possivelmente não tinha visto mais que uma ou duas vezes na vida, e usaram isso para seu proveito. Mas é uma experiência pela qual todos passamos, a amizade utilitária”.

O Papa explicou que “a amizade é um acompanhar a vida do outro”.
“Em geral as verdadeiras amizades, não se explicitam, dão-se e vão como cultivando-se. A tal ponto que a outra pessoa já entrou em minha vida como preocupação, como bom desejo, como sã curiosidade de saber como vai, como vai a sua família, seus filhos É dizer que alguém vai entrando”.

O Santo Padre disse logo que “outra característica para distinguir a boa amizade de outras formas que são chamadas de amizade, mas na verdade são companheirismo, etc. É notar que com um amigo, mesmo quando você não o vê durante muito tempo, quando o encontra, e às vezes passam meses ou até um ano, você sente como se te tivesse visto ontem, conectam num instante. É uma característica muito humana da amizade”.

Diante da pergunta sobre o sentido profundo da amizade como Vigário de Cristo na terra, o Papa comenta que “nunca tive tantos ‘amigos’ entre aspas, como agora. Todos são amigos do Papa. A amizade é algo muito sagrado. A Bíblia diz: ‘tenha um ou dois amigos’”.

“Antes de considerar um amigo, deixe que o tempo o prove, veja como reage diante de você. E é o que aconteceu em nossa história. Você evangélico, eu católico e trabalhando juntos por Jesus. Mas não só funcionalmente, mas esta amizade foi dando-se e também envolveu a sua mulher, seus filhos”, disse o Papa ao jornalista recordando a sua longa relação de amizade com Figueroa, que o conhece desde que era bispo em Buenos Aires.

Na amizade de ambos “também houve momentos escuros. Não é certo? Como quando você teve que passar o túnel da incerteza que te dá uma Doença. Confesso-te, eu sentia a necessidade de estar perto de ti, da sua mulher, dos seus filhos. Porque um amigo não é um conhecido, alguém com quem você apenas goza de um bom momento de conversa”.

O Santo Padre ressaltou que “a amizade é algo profundo. Eu acredito que Jesus quis que isto se desse. Indo além da sua piada de que você é ‘minha ovelha protestante’, está essa aproximação humana de poder falar de coisas comuns com profundidade”.

Sobre a dimensão espiritual da amizade de Deus com o homem, o Papa Francisco disse que a atitude do Senhor “está repleta de carinho paternal, é obvio, mas também de amizade. Não sei como podemos interpretar isso de que Deus e Moisés falavam cara a cara, como um amigo fala com outro amigo. Quer dizer: Deus amigo de Moisés! Essa capacidade de lhe confiar tudo, seus planos, o que ia fazer…”.

Depois de fazer um repasse sobre a passagem bíblica de Caim e Abel e como esse episódio é uma mostra clara da “cultura da inimizade” em que muitas vezes está submerso o homem, o Santo Padre explicou a importância da paciência para que as pessoas sejam boas amigas.

“É um mistério a paciência de Deus, como também é necessária a paciência para forjar uma boa amizade entre duas pessoas. Tempo e paciência. Como dizem os árabes: ‘é preciso comer vários quilogramas de sal’. Muito tempo para falar, estar juntos, conhecer-se e aí se forja a amizade. Essa paciência na qual uma amizade é real, sólida. Porque nesse tempo passam muitas coisas que deve-se responder como amigo, ou como indiferente”.

Figueroa questionou ao Papa sobre a possibilidade de ser amigos de Jesus e como se pode viver essa amizade: “Ele o disse na Ceia: ‘já não vos chamo servos, e sim amigos’. O servo não sabe o que vai fazer seu senhor, o amigo sim. Ou seja conhece os segredos”.

“O que significa hoje –prosseguiu o Papa– é deixar que ele nos diga amigo. Porque frente à palavra de Jesus que te diz amigo. Ou é um néscio, ou um desgraçado que não entendem o que significa, ou abrem seu coração e entra-se nesse diálogo de amizade. Jesus aposta muito aí, porque poderia ter dito o metre, o doutor, poderia ter usado tantos títulos. Não, ‘vocês são meus amigos, eu os escolhi por amigos’”.